quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

ECOS DA ÍNDIA IV

Após passar o ano-novo na cidade de Cochin, nosso enviado especial se estabeleceu na nossa já conhecida Kannur para a primeira etapa formal de sua viagem: três semanas de curso em tempo integral, complementando o curso que ele vinha fazendo no Brasil (num ritmo de um final-de-semana intensivo por mês). O idioma corrente em Kannur chama-se malayalam. Na Índia, se acostumem, há uma miríade de idiomas (dependendo da forma de contar, como idioma ou como dialeto, pode girar em torno de 400!), sendo que o hindi é apenas o principal deles: há 22 idiomas oficiais nacionais – além de outras 18 que a Constituição considera como línguas regionais. Embora o inglês tenha sofrido forte resistência no clima pós-independência, por questões práticas ele continua sendo utilizado, principalmente na esfera dos negócios, da alta administração e de pesquisas de ponta – a Índia, por exemplo, é reconhecidamente terra de grandes desenvolvimento na área de software. Voltando ao curso do Luis, as aulas foram puxadas e formais. Os professores, ainda que sorridentes e bem-humorados como todos os indianos, eram muito exigentes, inclusive em questões de disciplina escolar: por exemplo, para se ir ao banheiro, era preciso levantar e pedir licença! Os estudos exigiram dedicação quase total: além da aula, era necessário estudar em casa à noite, senão o aluno ficava perdido com o volume de matéria e não conseguia acompanhar o ritmo requerido. O grupo de brasileiros conseguiu estabelecer um ótimo entrosamento, o que foi um alívio para ele. E eu complemento com minha experiência pessoal: todos que já viajaram em grupo sabem como uma estada de viagem, principalmente por um tempo mais longo que um final-de-semana, pode vir a criar pequenas rusgas que, com o atrito constante, de faíscas, acabam tomando proporções de incêndios. Para evitar esse problemas, no entanto, basta bom senso, muito humor e prática de vida em comunidade (algo que muitas pessoas não possuem, infelizmente). O local do curso era um college, distante cerca de 3 km do local de estadia. Aproveitando essa distância, ele normalmente fazia o caminho andando, ou então usando o rickshaw, uma forma de moto extremamente usada como transporte, que comporta o motorista e até três passageiros. Mesmo os atos comuns do dia-a-dia, tais como esses deslocamentos para a escola, pediam atenção constante. O Luis diz que há uma poluição onipresente e em todos os sentidos (ambiental, sonora, visual). Talvez pela mistura do calor com a
Cara e coroa: duas versões do "rickshaw". À esquerda, um motorizado, de uma frota mais moderna; o da direita, bem mias rudimentar, à tração humana, nas ruas de Calcutá.
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atmosfera caótica, ele diz ser impossível sair às ruas entre 11 e 16 horas. Além da constante multidão de transeuntes, fazendo do ato de se locomover uma arte, o trânsito, como já comentamos, é infernal: na direção, as regras nativas incluem o desuso do retrovisor e a multifuncionalidade das buzinas, que fazem um coro ensurdecedor. Por exemplo: quem quer ultrapassar alguém tem a obrigação de avisar que quer ultrapassar... buzinando (com direito a pára-choques com a advertência “buzine por favor!”). Ah, ele informa um dos seus passatempos mais constantes: ir ao supermercado. Dessa forma, ele ia averiguar os hábitos de consumo indianos e, em particular, os produtos ayurvédicos nas prateleiras, produtos esses muito cobiçados no exterior (inclusive no Brasil) pelos estudandes sérios da Ayurveda – obviamente, mais raros e caros fora da Índia devido aos trâmites do comércio internacional. Esse curioso passatempo, na verdade, não é uma novidade para mim: um colega de trabalho já havia me dado um toque que a esposa dele adora ir nos supermercados de todos os lugares que visita. Segundo ela, é a melhor forma de entrar no cotidiano das pessoas. Acho que faz sentido – embora eu nunca tenha freqüentado supermercados nas minhas viagens, me utilizo sempre de expedientes similares, buscando o cotidiano nas situações corriqueiras das pessoas de cada local (o que e onde elas comem? como se deslocam? o que fazem nas horas vagas? como são os bairros fora do circuito turístico?). Então, fica a dica de incorporar os supermercados entre os pontos preferenciais para se apreender os aspectos cotidianos da cultura local de cada povo. Nos próximos posts, vamos dar continuidade abordando os hábitos das pessoas e mais características dos lugares, bem como o final do curso em Kannur, ocorrido no final da semana passada.

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