sábado, 14 de fevereiro de 2009

ECOS DA ÍNDIA V

Hoje vamos falar sobre o dia-a-dia do Luis no período do curso em Kannur. Ele logo ressaltou as roupas típicas do local: as mulheres vestidas (ou melhor, cobertas) de preto e os homens usam o “dothi”. Muito bem, o que é o “dothi”? Como uma imagem vale mais que mil palavras, providenciei uma ilustração para mostrá-lo (obs: esse não é o Luis, trata-se de um nativo), mas vale a pena repassar a descriçaõ do Luis: “uma espécie de sainhas masculinas, tipo sarongue, de algodão branco, com um barrado que varia de cores; não se trata de uma camisa; acompanha um lençol de 4 metros que os homens enrolam na cintura”. Nas ocasiões formais, usa-se em estilo longo; caso contrário – e quando o calor aperta – dobram a barra em direção à cintura, de forma que a indumentária fica com um aspecto “balonê” (algo que deve ser involuntariamente hilário, penso). Claro que, num ímpeto de novidades, o Luis comprou seu próprio dothi, mas, a despeito do seu professor ter prometido ensiná-lo a vestir, acabou ficando receoso de usar: não sabia como amarrar aqueles 4 metros de pano e ficou com medo de cometer gafes na forma de usar o traje.Afinal, pior que não fazer é tentar fazer errado, acho que faz sentido. rs.

Logo após a chegada para se iniciar o curso, eles foram submetidos a uma consulta com os mestres da escola. Com base nesse exame, eram indicados para fazer tratatamentos específicos, que se somavam à rotina do curso ( por si só naquele ritmo puxado que já comentamos). O Luis, por exemplo, se submeteu a um tratamento de uma semana, todos os dias , de uma massagem chamada “shavurthee” – da qual eu nunca tinha ouvido falar, aliás. Funciona assim: o massagista se dependura numa corda presa ao teto e faz a massagem com os pés – o paciente fica deitado no chão. Ele disse que adorou e que o efeito é ótimo. No oitavo dia, ele complementou o tratamento com uma “purgação induzida” com óleo de rícino medicado com ervas – o objetivo é eliminar toxinas concentradas no abdômem em decorrência da semana de massagens. A massagem “shavurthee” veio das técnicas de manutenção de saúde de lutadores de uma arte marcial chamada “kalari”, oriunda do próprio sul da Índia, sendo considerada a raiz de várias outras modalidades de massagem dessa região.

No seu caminho entre a moradia e o curso (que, como falamos no outro post, ele aproveitava para fazer muito a pé) ele passava sempre à frente de uma escola inglesa e acabou fazendo amizade com os alunos, que estavam muito interessados em conversar com ele e tirar fotos – ele diz que as crianças são extrovertidas, simpáticas, sorridentes e muito “conversadeiras”. Notou que elas usam aqueles uniformes típicos dos anos 30 ou 40 (eu, por obra de liberdade poética, imaginei algo parecido com Havana, em Cuba, onde muitas vezes imagina-se parado no tempo... será que tem algo a ver? vou consultar o Luis). Estabelecidos esses primeiros contatos naturais, o professor de Ciências convidou-o a comparecer numa sexta-feira para fazer um bate-papo com a classe, certamente para levar ao conhecimento deles um pouco do que é ser um brasileiro e da nossa visão de vida.

Lodo de início, ele adorou o aspecto da culinária... a comida é muito barata, diz que um "verdadeiro banquete" sai por meros R$ 6,00! Se quiser beber os sucos, no entanto, o preço dobra (ainda assim o preço total é uma pechincha). Nossas idéia de que o condimento lá é muito forte está correta. As comidas indianas com as quais estamos acostumados aqui (ele cita como comparação o Tandoor e o Govinda, famosos restaurantes paulistanos) são “fraquinhas” perto daquelas que se acha por lá em “qualquer buraco”. Deliciosas – e muito apimentadas. A base da culinária da região, aliás, é vegetariana (mas, lembremos, nem toda culinária indiana é apenas vegetariana).

Ele ficou muito impressionado com o massagista, um senhor de 86 anos, chamado Mr. Krishnna. Imaginem alguém com essa idade e com condicionamento físico, alongamento e disposição para aplicar uma vigorosa massagem dependurado numa corda! Não sei como, mas o Luis disse que eles conseguiram se comunicar “muito bem” no idioma malayalam (!). Na última sessão, o mestre massagista convidou o Luis para aprender a técnica “shavurthee”. Ele ficou verdadeiramente emocionado com o convite. Mas isso exigiria um mínimo de duas semanas de dedicação, tempo que ele não tinha disponível, pois já estava no final de sua estada no curso em Kannur e de malas prontas para Coimbatore. Conclusão: em suas próprias palavras, ele já tem "um grande motivo para voltar à Índia". Quem sabe alguns de nós não aproveitamos e vamos com ele da próxima vez.

Nos postss seguintes, vamos falar do clima de religiosidade e da passagem de Luis pela cidade de Cochin, antes de chegar a Coimbatore.

Em tempo, atendendo a um pedido meu, o Luis providenciou um dhoti para mim. Vou tentar convencê-lo a vestirmos esse traje típico e sairmos pelas ruas de São Paulo. Espero que, numa cidade pretensamente cosmopolita como a nossa, isso não seja motivo de estranhamento algum. rs.

6 comentários:

Anônimo disse...

Eric,
adoraria vê-lo de dhoti, vai combinar muito com seus pêlos, imagino você saindo na rua só de dothi e com o torso desnudo (como na sua foto ilustrativa).

Você ainda pode pedi para alguém pisar em você, que como vimos, tem outra conotação neste parte da India.

Unknown disse...

Eric nas ruas vestindo um "dhoti" causará um furor ainda maior do que o Flávio de Carvalho desfilando de saiote em frente ao Teatro Municipal, no verão de 1957.

ERIC disse...

TUCA,

Ou pode virar uma cena paradigmática tal qual a tanga de crochê do Gabeira. rarara. Mas duvido muito - nesses tempos de liberdade, as pessoas já avançaram muito além do saiote e da tanguinha (ou não?? boa pergunta!). Abçs!!

VeniMorais, o Gwy. disse...

Olá! Meu nome é Venicius e sempre quis saber como é a amarra do dothi, vc poderia postar algo sobre isso?

Um forte abraço!

ERIC disse...

VENICIUS,

Meu dhoti já está no Brasil, aguardando eu pegá-lo. De repente, eu posto um "faça fácil" pra ensinar os interessados em usar um desses por aqui. rs. Aguardemos.

VeniMorais, o Gwy. disse...

UEBA!

Mal, posso esperar para aprender junto à vc!

Ficarei sempre observando seu blog!

Obrigado!